Para quem ainda não conhece essa foto, aqui vai a primeira informação: ela não foi alterada por IA.
Mas decidi publicá-la aqui para falar sobre IA, porque penso que ela ilustra com perfeição tudo o que venho ouvido sobre como precisamos lidar com os seus impactos sobre o nosso trabalho, sobre as nossas vidas.

Esse flagrante espetacular das duas libélulas na ponta das baionetas foi captado em 1967 (antes, portanto, também das máquinas digitais) pelo fotógrafo Evandro Teixeira, meu pai.
Ele cobria, para o Jornal do Brasil, um evento comemorativo do Dia do Soldado, no Monumento aos Pracinhas, no Rio, com a presença do então presidente da República, General Costa e Silva. O país vivia em plena ditadura militar.
A foto foi publicada com enorme destaque na primeira página do jornal. O censor, que vivia dentro da redação do jornal, não compreendeu a ironia da imagem, e a liberou. Já o registro do evento em si, no qual aparecia o presidente, ficou na página de dentro.
Evandro era um mago em capturar o contexto de cada cenário com o qual se deparava. Não se contentava com o óbvio a ser registrado. Ele observava tudo à sua volta e, magistralmente, organizava todo o conteúdo que lhe interessava dentro do visor de sua máquina – manual e depois digital, não importava.
Dessa maneira, suas fotos transmitiam mensagens, emoções. Era assim na política, no esporte, na moda, em cenas cotidianas das pessoas, das quais extraía imagens incríveis.
Assim, também parecia estar sempre pronto para eternizar um flagrante, algo que só ele via, mesmo quando estava numa multidão. Evandro dizia que a sorte o ajudava, mas sabemos que ele fazia muito por onde para encontrá-la.
E o que o movia em sua genialidade?
Curiosidade, adaptabilidade, olhar crítico, leitura aguçada do contexto, profunda conexão com as pessoas.
Pois bem, são exatamente essas as características que os mais diversos especialistas em IA estão bradando em palestras e eventos, para que a gente não apenas preserve, como reforce. E, assim, possamos surfar na onda gigantesca da IA sem sermos engolidos.
Reforçarmos o que nos faz humanos.
Quantos segundos durou o pouso das libélulas nas baionetas? Nem Evandro soube calcular. Mas não importa. Graças ao olhar dele, podemos contemplá-las lá para sempre.
Carina Almeida, Sócia-Presidente da Textual Comunicação